Avançar para o conteúdo principal

Mensagens

A mostrar mensagens de junho, 2013

transparências

o mundo é um lugar em constante mudança. desde a primeira hora, do primeiro minuto e do primeiro segundo. é essa aliás a essência da sua criação. se as moléculas tivessem permanecido estáveis, de mão dada a olhar para a lua ou a apanhar sol numa esplanada, jamais teriam entrado em choque e dado origem, por exemplo, à vida. não sei se na origem do mundo existiam esplanadas. mas não tem grande importância para o caso. o que importa é que a rebelião entre elas degenerou numa bela sopa e a pouco e pouco tudo se foi orientando na direcção do que hoje somos e daquilo em que nos tornámos. das coisas mais apaixonantes das descobertas científicas modernas (o dicionário não reconhece apaixonante como uma palavra válida, alguém lhe dê um beijo bem dado) é perceber que a mudança até se consegue ir cunhando à medida que o próprio indivíduo avança, e que determinadas características que conferem vantagem selectiva são passadas à geração seguinte, algo que até há poucos anos se julgav

a porta errada

o prédio era estranho. não há portas de prédios com motivos de ferro em cor-de-rosa e com um olho dentro de uma forma triangular. ainda assim entrou porta dentro com a decisão de quem sabe ao que vai. ève charlier tentava demover pierre dumaine de abandonar o apartamento. ' você sabe que é muito muito perigoso. ' ' perdoe-me ève, sabe bem que tenho de ir. são os meus amigos. eles vão ser massacrados, ève, sabe bem que não a amo menos por isso! ' ouvem-se passos pesados nas escadas e, após uma longa pausa, alguém bate à porta com insistência. pierre voa para junto do móvel onde guarda o revólver, que rapidamente tira e aponta à porta. ' quem é e ao que vem? ' ' é do círculo de leitores! ' ' círculo de leitores? o que é isso, homem? aposto que é um enviado do regente! ' ' não, não, sou mesmo um enviado do círculo de leitores. faço toda esta zona de massamá. ' ' massamá? mas você não sabe que está às portas de pari

um, dois, experiência

dou por mim muitas vezes a pensar que o conforto da rotina retira alguma acutilância à capacidade de observação. fazer os mesmos caminhos, subir os mesmos degraus, repetir as mesmas tarefas, do alourar alho e cebola ao dobrar de camisas, permite-nos manter um padrão e entender a linha orientadora do dia-a-dia. a paz quase uterina que tudo isso nos traz (por mais que nos finjamos todos mentes hipercriativas e passemos o tempo a bradar aos céus que a rotina é um horror) é uma espécie de reset diário, um re-acertar dos ponteiros quando se encontram de novo ambos a zero graus e nas doze. sair do ciclo da rotina e dar um mergulho nas águas do desconhecido pode ser abordado de modos bastante distintos. pode-se optar por ir com o medo do que nada naquelas águas escuras. pode-se tentar mergulhar com uma armadura medieval vestida imaginando-se mais esperto que todos os possíveis monstros marinhos. pode-se, por último, mergulhar com a descontracção de quem quer descobrir e experimentar em

contrariedades

aprendi, entre outros, com o cesário verde a ter um gosto especial por olhar pela janela nas horas mais tardias da noite, perdendo-me em pensamentos que se misturam com luzes de um ou outro quadrado isolados na escuridão. são dezenas de janelas. são dezenas de vidas. são cortinas diferentes. são espaços abertos. vejo televisões que expulsam um arco-íris cá para fora. vejo silhuetas humanas. umas paradas, outras em leve e discreto movimento, dando fracas dicas sobre a pulsatilidade do coração que as abriga. não há fumo, neste sítio não há fumos nas janelas. e ácidos quando muito os da chuva, pelo menos na maior parte dos prédios, na maior parte dos dias. há luzes que se apagam. pergunto-me quem está lá por trás. se é o fim do dia. se é a desistência da noite. se quem carregou o peso de pressionar o interruptor vai agora passar horas e horas a fio em sofrimento insoníaco . mudam as janelas que têm luz. mudam as janelas que estão apagadas. não há simetria. nunca há simetria. não há